sexta-feira, 23 de novembro de 2007

O Sufismo Islâmico e suas origens.

O sufismo, aspecto interior ou místico do islamismo, é um modo de vida que busca a realização da unidade e da presença de Deus por meio do amor, do conhecimento baseado na experiência, da ascese e da união extática com o Criador bem amado.
Os próprios textos sufis revelam que o ascetismo e as atividades devocionais dos monges cristãos, assim como a circulação de idéias neoplatônicas e herméticas, foram importantes em certas épocas da história do sufismo; mas é preciso buscar as verdadeiras origens do movimento no próprio islamismo, principalmente no Corão, nos hadlths e nas correntes devocionais e ascéticas. Como observa S. H. Nasr, a busca de Deus não é explicada por empréstimos históricos.
Os termos "sufi" (sufi) e "sufismo" (tasawwuf) derivam, provavelmente, das roupas de lã (súf) usadas pelos ascetas muçulmanos, designados pelo apelativo genérico "pobre" (faqir ou darvish). O sufismo começa com Maomé, pois, em virtude de sua estreita relação com Deus, de sua revelação, de sua ascensão (mi 'rãj) através dos céus e de sua condição superior entre as criaturas, os sufistas consideram-no um dos seus. As provas de seu sufismo são buscadas nos hadiths e no próprio Corão, fonte inesgotável de edificação mística, pois comunica o testemunho original da semente de Adão e Eva, reconhecendo Deus como seu Senhor para toda a eternidade, e estabelecendo, assim, um pacto que obriga as duas partes (Surata 7, 172). Outra surata do agrado dos sufistas (50, 16) apresenta Deus como "mais próximo do homem que sua veia jugular". Finalmente, outro elemento que os sufistas reconhecem de bom grado no Corão é a recomendação de praticar o dhikr, meditação ou invocação de Deus (13,28; 33,14). Nas práticas dos sufis, o dhikr pode ser acompanhado pelo uso de um rosário, pelo controle respiratório, por música e por danças extáticas, como as dos mawlawiyas (mevlevis) ou dervixes rodopiantes da tradição de Jalãl al-Dln Ruml (1207-1273), o grande poeta místico de Konya (Turquia).
Nas tradições referentes à comunidade de Maomé, encontram-se alguns fiéis particularmente rígidos e conservadores que representariam o elemento antimundano da fé nascente. Alguns vêem neles os primeiros sufis. Na época dos primeiros califas e da conquista, erguem-se vozes que protestam contra as transformações dos costumes e das práticas. Outra questão que se apresenta é a de saber se é preciso trilhar o caminho da observância ritual e do legalismo ou o da fé interior e do amor. Deus será um Senhor distante e completamente alheio ou será ele amoroso e acessível? Quando o califado é transferido pelos Omíadas para Damasco, longe da rude península da Arábia, cresce mais a tensão entre a secularização dos costumes e os fundamentalistas que a deploram.
Hassan al-Basri (m. 728), um dos primeiros ascetas muçulmanos que sempre têm em mira o julgamento de Deus e invectivam o materialismo do mundo, encontra uma justificação para a sua sisudez no próprio hadith do Profeta: "Se soubésseis o que sei, riríeis pouco e choraríeis muito."
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* Texto adaptado da obra de Mircea Eliade
ELIADE, Mírcea; COULIANO, Ioan P. Dicionário das Religiões. 2a ed. Trad. Ivone Castilho Benedetti. São Paulo, SP, Ed. Martins Fontes, 2003 - Capítulo 20.

quinta-feira, 22 de novembro de 2007

As Primeiras Mulheres Solistas e Pregadoras

Musicalmente heterodoxas, as confissões santificadas também diferem das batistas e metodistas que permitem que as mulheres sejam solistas. Todo o furor pentecostal desencadenou uma meia dúzia de gravações de uma missionaria, Josephine Miles e da irmã Elizabeth Cooper em 1928 (entre elas “Gods Warning to the Church”). Miles pronunciava poderosos sermões com uma voz rouca e exaltada, acompanhada de um piano e das lamentações de Cooper, e que eram interrompidas por exortações ao “grande nome do bendito Deus”. Ela se retorcia de fúria perante à incredulidade com uma convicção que muitos evangelistas masculinos invejavam.
As mulheres das igrejas Santificadas incluíam nas suas apresentações um grande grupo de cantores, músicos exaltados, além de evangelistas.
A voz grave e reverberante de Bessie Johnson se podia ouvir em uma dúzia de discos gravados entre 1928 e 1929. Um de seus acompanhantes, violonista e cantor, Lonnie Mclntorsh, recordava-a como a melhor cantora que não tinha conhecido nunca. Em um tema junto com Will Shade, do grupo Memphis Jug Band, no violão, guiava os Memphis Sacrified Singers numa canção que manifestava sua afiliação a igreja Santificada. “He got the Holy Ghost fire” (Ele teve uma chamada do Espirito Santo), cantava sobre o seu salvador em “He Got Better Things For You”.
As irmãs das igrejas Santificadas eram muito audazes. A irmã Cally Fancy não se acovardava na hora de soltar duras críticas aos poderosos na sua gravação de 1931 “Death Is Riding Through the Land. Parts l and 2”.

Presidential Life is in Gods hand, / A vida do presidente está na mão de Deus,
This message is for you, too; / Esta mensagem também lhes concerne;
And, Governors, remember, / E, governadores, recordem,
When y ou are sentencin'men, / Quando condenam os homens,
My God is watching you. / Meu Deus lhes está observando.


Na segunda parte da sua canção, a irmã Fancy tornava-se profética:

You think the war is over / Crêem que a guerra terminou
Because de U.S.A. / Porque os Estados Unidos
Have joined the League of Nations / Se uniu a Liga das Nações
But the War is on her way. / Mas a guerra segue o seu curso.


Em 1931, Japão invadiu Manchuria e a ascensão ao poder de Hitler na Alemanha só ocorreu dois anos depois. Fancy aconselhava que os homens depositassem a sua confiança em Deus e não nas armas, cantava: “He can face the Huns without machines gun” (Ele pode enfrentar os boches sem metralhadoras”).
Texas Arizona Dranes, uma cantora e pianista cega, tinha só vinte e um anos quando fez a sua primeira gravação para Okeh em 1926 e foi uma das que mais se destacou na convenção da Igreja de Deus de Cristo em Mênfis. Ela apresentou-se em igrejas de Texas a Chicago, onde serviu como fonte de inspiração à Rosetta Tharpe. Ao escutar sua combinação de harmonia e síncope em algumas de suas canções para piano tais como “Crucifixion”, é fácil imaginar a relação com pianistas da igreja Pentecostal convertidos em roqueiros como Jerry Lee Lewis.

As primeiras gravações de pregações

Se você é evangélico, certamente já ouviu falar de uma mensagem gravada em vinil intitulada “A Última Trombeta”. Trata-se de uma revelação em sonho a respeito dos últimos acontecimentos narrados no livro do apocalipse. O que poucos sabem é que a origem destas gravações está ligada as raízes do holy blues.
Com o passar do tempo, ficou evidente que o blues não era a única música negra que as companhias fonográficas podiam explorar com sucesso. Começaram a recrutar pregadores negros para que gravassem sermões de três minutos de duração interrompidos por shouts e cantos congressionais. “As an Eagle Stirreth Up Her Nest”, de Calvin Dixon, foi a primeira destas gravações, em 1925, e se pode dizer que o gênero funcionou bem até o aparecimento do LP. As gravações dos pregadores cantando e recitando sermões para animar a congregação aumentaram depois de 1926 quando “The Dawnfall of Nebuchadnezzar”, do reverendo J. C. Burnett, vendeu mais de oitenta mil cópias e quando o reverendo J. M. Gates gravou “Death's Black Train Is Coming”, fez soar animadamente as caixas registradoras. Paul Oliver, em Songsters and Saints Vocal Traditions on Race Records (1984), assinalou: “Com o tempo, aproximadamente no espaço de uma dúzia de anos, se editaram 750 sermões de uns setenta pregadores».
O mais popular foi o Rev. J.M. Gates, que gravou uns duzentos títulos entre 1926 e 1941. Alguns, como “The Need of Prayer” (1926), incluem comovedores exemplos dos canto de lamentos que Higginson ouviu nos acampamentos durante a guerra civil. Outros seguramente captaram compradores pelos títulos impactantes, entre os quais se incluem “Dead Cat on the Line”, “Manish Women” e “Speed On, Hell Is Waiting for You”, uma advertência aos motoristas imprudentes. Gates utilizava os temas e jargões do momento como parte do seu atrativo. Sua mensagem de 1930 sobre a Depressão, “These Hard Times”, usava a expressão “Its tight like that” para indicar a escassez nacional de trabalho, dinheiro e comida. O reverendo Gates foi provavelmente o pregador que teve mais sucesso de todos os que gravaram discos, o que impressionou a Thomas Edison (o inventor do gramophone e da luz elétrica) , que anotou no seu arquivo de audições: “Pode ser que este senhor seja maravilhoso, mas eu não sei o que fazer com ele. 9/10/26”.
Além do enorme sucesso dos sermões com canções gravadas pelos batistas como Gates e o reverendo A. W Nix, surgiram as gravações com veementes exortações (com música equiparável) dos pregadores das igrejas holiness (santificados) como o Rev. D. C. Rice e E W MacGee. Os pregadores das Igrejas Santificadas (Holiness e Pentecostal) podiam estar acompanhados de um piano sincopado, cornetas, trombones e pandeiros, ou violões e até mandolins, gaitas, jarras e tábuas de lavar (um grupo de jarras holiness aparecem nas gravações de 1928 dos Elder Richard Bryants Sanctified Singers).