segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

Islamismo - Calendário Religioso

O calendário religioso islâmico é lunar, com trezentos e cinqüenta e quatro dias: as festas, portanto, deslocam-se através das estações. O mês do Ramada é especialmente importante. Durante o dia, jejua-se e cultivam-se as obras religiosas. No fim do Ramada, ocorre a comemoração da Noite do Poder, Laylat al-Qadr, quando Maomé recebeu a primeira revelação. Durante essa noite, abrem-se as fronteiras entre o mundo angélico e este mundo. O "id al-Fitr marca o fim do jejum. Dhu al-Hijjah é o mês da peregrinação a Meca. Em estado de pureza física e ritual (ihrãm), os peregrinos andam em torno da Caaba, visitam os túmulos de Agar e Ismael e o poço de Zamzam, percorrem a distância entre dois túmulos em memória de Agar em busca de água, ficam de pé durante uma tarde na planície de Arafat e jogam seixos no pilar de Acaba, em Mina, que representa Satã tentando Abraão e sugerindo-lhe abandonar a imolação do filho Ismael. O grande sacrifício e a distribuição de carne em memória do sacrifício de Abraão (íd al-Adhã) terminam o hajdj. A celebração ocorre em todo o mundo muçulmano.
O islamismo xiita tem suas próprias festas, sendo a mais importante a 'Ãshurã (10 do mês Muharram), comemoração do martírio de Hussein (<-> 20.6). Os dias de luto em memória de Hussein compreendem cantos, récitas, representações dramáticas do conflito, que podem degenerar em escaramuças, e procissões de flagelantes que transportam ataúdes de madeira pelas ruas. Os aniversários dos imãs, inclusive o de Ali, são celebrados pelos xiitas. O dia de Maomi (Mawlid al-Nabí, em 12 de Rabfal-Awwal), comemoração do seu nascimento, e a noite do mi'rãj no mês de Rajab, são celebrados por todos os muçulmanos.
ELIADE, Mírcea; COULIANO, Ioan P. Dicionário das Religiões. 2a ed. Trad. Ivone Castilho Benedetti. São Paulo, SP, Ed. Martins Fontes, 2003 - Capítulo 20.

Islamismo - expansão territorial

Os quatro primeiros califas (632-661) haviam conquistado o Oriente Próximo, do Irã ao Egito. Damasco caiu em 635; Jerusalém, Antioquia e Basra, em 638. As conquistas se sucediam com rapidez: a Pérsia (637-650), o Egito (639-642). De 661 a 750, os Omíadas de Damasco continuaram a expansão territorial do califado para o leste (Afeganistão) e para o oeste (África do Norte e Espanha). Explorando habilmente o particularismo dos berberes, que, contudo, souberam resistir à conquista manipulando o instrumento do cisma (principalmente carijita), em 711 o exército muçulmano atravessava a Ifriqiya (o norte da África) e chegava até o Maghrib al-aqsã, o extremo oeste, o estreito de Gibraltar, prosseguindo, com a provável ajuda do governador bizantino de Ceuta e dos judeus perseguidos dos centros urbanos, a conquista de al-Andalus (de etimologia desconhecida, talvez de Vandalicia), o reino dos visigodos da Península Ibérica que compreendia a Espanha e Portugal de hoje. Depois da queda da capital de Toledo, os árabes eram senhores absolutos, até os Pireneus. Seu ímpeto parou nas montanhas, principalmente quando Carlos Martel, em Poitiers (732), freou seu avanço na França. Destronados em 750 pelos Abássidas de Bagdá, os últimos Omíadas encontrariam refúgio em al-Andalus. O esplêndido califado de Cõrdoba manteve-se de 756 até o período de anarquia dos Reinos de Taifas (do árabe tawa'if, "partido", "bandeira"), de 1031 a 1090, quando os estados cristãos do norte da Espanha romperiam decisivamente as linhas dos inimigos, conquistando Toledo em 1085. Ocupada sucessivamente pelas dinastias berberes dos Almorávidas (1090-1145) e dos Almôadas (1157-1223), a Espanha ia sendo pouco a pouco evacuada pelos muçulmanos, que, porém, se mantiveram até 1492 numa faixa territorial estreita na costa mediterrânea: o emirado nazarita de Granada. Em 827, os Aglábidas de Ifriqíya partiram para a conquista da Sicília e do sul da Itália, de onde seriam repelidos pelos bizantinos. A ilha foi ocupada em 902, tornou-se fatímida em 909 e quase independente em 948. Foi tomada pelos normandos em 1091. A partir do século XI, os homens fortes do islamismo são os turcos, islamizados no século X, em especial os Seljúcidas, que se apoderaram do trono dos Abássidas em 1058. Serão derrubados em 1258 pelos mongóis (islamizados em 1300), que ocuparam o Iraque mas foram decisivamente detidos pelos turcos mamelucos que controlariam o Egito até a ocupação otomana em 1517. Do século XIV ao XIX, o islamismo é primordialmente representado pelo poderoso Império Otomano, fundado em 1301 na Ásia Menor. Em 1453, os otomanos apoderam-se de Constantinopla, que se torna sua capital (Istambul). No leste, os turcos mamelucos instalam seu sultanato em Delhi (1206-1526). De 1526 a 1658, o norte da índia será submetido ao império islâmico dos Grão-Mogóis, descendentes dos mongóis. A Indonésia e a Malásia foram em grande parte convertidas através das rotas comerciais que as uniam aos países muçulmanos. O mesmo ocorreu com certas zonas da África situadas abaixo do Saara.
ELIADE, Mírcea; COULIANO, Ioan P. Dicionário das Religiões. 2a ed. Trad. Ivone Castilho Benedetti. São Paulo, SP, Ed. Martins Fontes, 2003 - Capítulo 20.

Islamismo - Sucessão e secessão

Ao morrer Maomé (632 d.C), enquanto seu primo e genro 'Ali-ibn Abi Tãlib e seu tio Ibn 'Abbãs velavam piedosamente o corpo sem vida, os outros partidários se reuniram ao lado para escolher um sucessor ou califa (Khalífah, de khlf, "seguir"). Esse título significará daí em diante que o califa reúne em si duas funções que deveriam ficar separadas em qualquer outro ser humano: a função militar de comandar crentes (amir al-mu'miríin) e a função religiosa de imã dos muçulmanos (imãm al-muslimln). Ao amanhecer, depois de longas deliberações, a assembleia decidiu que o primeiro sucessor seria Abu-Bakr, sogro do profeta e companheiro da Hégira em Medina, escolhido por Maomé para dirigir, em seu lugar, as orações em comum. Durante os dois anos de seu califado, AbQ-Bakr estabeleceu definitivamente o domínio muçulmano na Arábia e empreendeu expedições contra os beduínos revoltosos e contra a Síria bizantina. Sucessor de Abu-Bakr e segundo califa na sucessão sunita, Ornar (634-644) conquistou a Síria e boa parte do Egito e da Mesopotâmia. Foi depois de sua morte que começaram as grandes secessões religiosas, que resultariam na formação de seitas cujo número é tradicionalmente fixado em 272. Na verdade, os partidários de Ali, primo e genro do profeta por ter-se casado com sua filha Fátima, esperavam que ele fosse então investido da dignidade de califa, mas o aristocrata Otmã (644-656), da família dos Omíadas de Meca, antigos adversários de Maomé, foi eleito em seu lugar. A ideologia dos rawãfids ("os que repudiam [os primeiros califas]") xiitas ("partidários", de shi 'at 'AH, "partido de Ali") exige que a sucessão se estabeleça segundo laços de parentesco mais estreitos. Segundo eles, o califa não deve ser apenas curaixita, mas também hashimita e fatímida, ou seja, não apenas da tribo do profeta, mas também de sua família e filho legítimo do casamento de Fátima com 'Ali ibn Abi Tãlib. Em outras palavras, a ShVa queria formar uma dinastia Álida mas a sorte decide por uma dinastia Omíada.
Em 656, o omíada Otmã é assassinado por um grupo de partidários de Ali, que não renega os assassinos. Eleito califa (quarto na ordem sucessória dos sunitas), Ali deverá enfrentar uma dupla temível que o acusa de cumplicidade no assassinato: o poderoso governador omíada da Síria, Moawia, e seu astuto general 'Amr ibn al-'Ãs, conquistador do Egito. Quando Ali estava vencendo a batalha de Siffín no Eufrates contra Moawia (657), 'Amr ibn al-'Ãs mandou pregar folhetos com textos do Corão nas lanças de seus homens e o exército de Ali recuou. O mesmo Amr ibn al-'Ãs propôs uma arbitragem en­tre Ali e Moawia e representou este último com tanta habilidade que os xiitas consideraram-se vencidos. Surgiu então uma nova complicação que cerceou ainda mais Ali em seus nobres escrúpulos: um grupo considerável de seu exército, os carijitas ou "dissidentes" por excelência (de khrj-, "sair, partir"), não reconheceu a arbitragem dos homens, pretextando que lã hukmatu Ma Allãh, "não há outro julgamento senão o de Deus". Os carijitas, puritanos do islamismo, não se preocupavam com o estabelecimento de linhagens dinásticas. Queriam que a dignidade do califado fosse eletiva e coubesse ao muçulmano mais devoto, sem distinção de tribo ou de raça: se merecedor, até mesmo um escravo etíope teria mais direitos ao califado que um curaixita. Essa doutrina era repudiada, também por outras características, pela maioria dos muçulmanos, para os quais perder a qualidade de membros da comunidade (ummah) dos fiéis era tão grave, se não mais, quanto uma excomunhão na cristandade medieval. Ora, ao contrário dos puritanos cristãos ulteriores, os puritanos muçulmanos sustentavam que a fé não basta, que há necessidade de obras para ter-se certeza da seriedade de um fiel. Por conseguinte, um muçulmano que pecasse deixava de fazer parte da assembléia dos fiéis. Esse respeitável zelo pela pureza moral combinava-se, nos carijitas, com escrúpulo de restabelecer a verdade histórica; eles afirmavam, portanto, que o Corão não é totalmente revelado. Em vez de combater Moawia, Ali voltou-se contra os carijitas que, afastando-se de Moawia, assassinaram Ali em 661. O califado coube a Moawia, fundador da dinastia dos Omíadas de Damasco (661-750).
ELIADE, Mírcea; COULIANO, Ioan P. Dicionário das Religiões. 2a ed. Trad. Ivone Castilho Benedetti. São Paulo, SP, Ed. Martins Fontes, 2003 - Capítulo 20.